A mídia tem divulgado nos primeiros
sete meses de 2018 uma série de acidentes envolvendo picadas por escorpiões. Os
dados encontrados no site Ministério da Saúde estão atualizados até 2017
evidenciando um aumento de 36% entre 2016 e 2017 dos casos de picadas por
escorpiões em todo o Brasil. Porém se fizermos uma comparação entre o ano de
2000 e 2017 veremos um acréscimo de cerca de 900% em número de casos, e esse
percentual varia de 5% a 30% ano após ano. É fato que os casos de acidentes por
escorpiões têm aumentado progressivamente necessitando de alertas à população
para se prevenir contra estes aracnídeos.
Trocando em miúdos, os escorpiões são
animais que pertencem ao filo Artropoda, Classe Arachnida e Ordem Scorpionida.
Os escorpiões responsáveis pelos ataques a humanos no Brasil pertencem à
Família Buthidae e são das espécies Tityus serrulatus, Tityus
bahiensis, Tityus obscuros e Tityus stigmurus. O veneno produzido por
estes animais ataca o Sistema Nervoso Periférico que age como ligação entre o
Sistema Nervoso Central e todas as partes do corpo através de seus nervos e
gânglios. Essas toxinas escorpiônicas causam massiva liberação de
neurotransmissores traduzindo-se em um quadro clínico grave que pode conduzir
ao óbito rapidamente em grupos mais vulneráveis como crianças e idosos.
Figura 1
Tityus serrulatus
Figura 2 Tityus stigmurus

Figura 3
Tityus bahiensis

Figura 4
Tityus obscurus
Os escorpiões são muito antigos e
provavelmente foram os primeiros habitantes da Terra a pisarem em terra firme.
Surgiram no período Siluriano há cerca de 350 milhões de anos atrás e os
fósseis encontrados são bastante semelhantes aos animais viventes.
Os escorpiões que causam acidentes
graves no Brasil pertencem unicamente ao gênero Tityus (Família Buthidae).
Embora existam 54 espécies de Tityus no Brasil, as espécies de importância
médica que causam envenenamentos graves ou fatais são T. bahiensis, T. obscurus, T.
serrulatus e T. stigmurus.
A espécie T. serrulatus é o
principal responsável pelos acidentes
escorpiônicos no Brasil, sendo responsável pela maioria dos casos de maior
gravidade e diversos casos fatais.
I - Tabela das principais espécies e
sua distribuição
Espécie
|
Distribuição
|
Informações
sobre acidentes
|
Tityus
bahiensis
|
Regiões
Centro Oeste, Sudeste e Sul
|
Segundo
maior causador de
acidentes
na região Sudeste
Registro
de acidentes graves
em
crianças
|
Tityus
obscurus
|
Regiões
Norte e Centro Oeste
|
Causador
de muitos acidentes na região Norte
|
Tityus
serrulatus
|
Regiões
Nordeste, Centro Oeste, Sudeste e Sul
|
Causador
do maior número de acidentes no Brasil Maior frequência de acidentes graves
Principal causador de óbitos no país
|
Tityus
stigmurus
|
Região
Nordeste e Sudeste
|
Causador
do maior número de acidentes na região Nordeste Com registros de surtos
populacionais em capitais do Nordeste, como Salvador e Recife
|
Os escorpiões são animais noturnos e
carnívoros. Sua principal dieta consiste em insetos variados. O encontro do
animal com um humano decorre de vários fatores. No ambiente rural, estes
encontros podem acontecer a trabalhadores da terra, poceiros e outras atividades
que aproximem o homem de seus esconderijos preferenciais, em troncos podres,
sob pedras, madeira ou no solo úmido da mata. Nas cidades eles se escondem
perto de residências humanas em entulhos, em madeiras empilhadas, aparecem em
linhas de trem sob os dormentes ou ainda em cemitérios, sob as lajes dos
túmulos. Sua presença em cemitérios tem uma razão de ser especial. Neste local
há grande abundância de baratas da espécie Periplaneta americana. Essas baratas
circulam por entre os túmulos, consumindo restos mortais e as baratas são uma
presa bastante apreciada pelos escorpiões.
O escorpião evita transitar durante o
dia. Como se trata de um animal caçador ele é mais frequentemente encontrado à
noite. Os pesquisadores destes animais costumam utilizar a luz ultra violeta
para encontrá-los com facilidade à noite. Por alguma razão ainda não muito
esclarecida, o dorso destes animais fluoresce na presença da luz ultra violeta
o que facilita muito a sua visualização.
Um aspecto interessante da biologia do
escorpião é a sua reprodução. Nas espécies que dependem do macho há todo um
ritual em que o macho libera a sua bolsa de esperma no solo e segura a fêmea
pela queliceras puxando-a para o local onde está a bolsa que é transferida para
a abertura genital para então ocorrer a fecundação.
No caso da espécie T.
serrulatus isso não é necessário, já que esta espécie é partenogênica,
ou seja, dispensa a interação do macho na multiplicação da espécie.
O
que fazer em caso de acidente
No caso de um acidente ocorrer, o Ministério
da Saúde orienta no sentido de manter o paciente com compressas mornas e
analgésicos e remove-lo de imediato para uma Unidade Hospitalar para o
atendimento. A rapidez de deslocamento é essencial nesses casos, especialmente
em pacientes menores de sete anos. O médico vai avaliar que tipo de tratamento
usar. Nem sempre é necessário a utilização do soro específico, mas isso vai
depender de várias condições que só um médico treinado pode avaliar. Nunca usar
gelo no local da picada pois pode aumentar a dor. Não há tratamento caseiro
para picada deste animal. Lavar
o local da picada com água e sabão; não fazer torniquete ou garrote, não furar,
não cortar, não queimar, não espremer, não fazer sucção no local da ferida e
nem aplicar folhas, pó de café ou terra sobre ela para não provocar infecção;
não ingerir bebida alcoólica, querosene, ou fumo, como é costume em algumas
regiões do país; levar a vítima imediatamente ao serviço de saúde mais próximo
para que possa receber o tratamento em tempo e se for possível, levar o animal
causador da picada para facilitar o tratamento através da identificação do
animal.
Os
primeiros sintomas
O sintoma inicial da picada de
escorpião é uma dor intensa no local da lesão. Outros sintomas podem aparecer
como suor excessivo, vômitos, aumento da salivação, taquicardia, pressão baixa,
falta de ar.
Como
prevenir acidentes
·
Manter
jardins e quintais limpos. Evitar o acúmulo de entulhos, folhas secas, lixo
doméstico e materiais de construção nas proximidades das casas;
·
Evitar
folhagens densas (plantas ornamentais, trepadeiras, arbusto, bananeiras e
outras) junto a paredes e muros das casas. Manter a grama aparada;
·
Limpar
periodicamente os terrenos baldios vizinhos, pelo menos, numa faixa de um a
dois metros junto às casas;
·
Sacudir
roupas e sapatos antes de usá-los, pois as aranhas e escorpiões podem se
esconder neles e picam ao serem comprimidos contra o corpo;
·
Não
pôr as mãos em buracos, sob pedras e troncos podres. É comum a presença de
escorpiões sob dormentes da linha férrea;
·
Usar
calçados e luvas de raspas de couro;
·
Como
muitos destes animais apresentam hábitos noturnos, a entrada nas casas pode ser
evitada vedando-se as soleiras das portas e janelas quando começar a escurecer;
·
Usar
telas em ralos do chão, pias ou tanques;
·
Combater
a proliferação de insetos, para evitar o aparecimento dos escorpiões que deles
se alimentam. As baratas costumam habitar as redes pluviais e de esgotos e esse
caminho é utilizado pelos escorpiões também em buscas de suas presas;
·
Vedar
frestas e buracos em paredes, assoalhos e vãos entre o forro e paredes,
consertar rodapés despregados, colocar saquinhos de areia nas portas, colocar
telas nas janelas;
·
Afastar
as camas e berços das paredes;
·
Evitar
que roupas de cama e mosquiteiros encostem no chão. Não pendurar roupas nas
paredes; examinar roupas, principalmente camisas, blusas e calças antes de
vestir;
·
Acondicionar
lixo domiciliar em sacos plásticos ou outros recipientes que possam ser
mantidos fechados, para evitar baratas, moscas ou outros insetos de que se
alimentam os escorpiões;
·
Preservar
os inimigos naturais de escorpiões e aranhas: aves de hábitos noturnos (coruja,
joão-bobo), lagartos e sapos.
O controle de escorpiões não se faz
com o uso inseticidas. Apesar de existirem algumas formulações registradas para
este fim os inseticidas só são úteis se forem aplicados para eliminar as
baratas que vivem nas redes subterrâneas de esgotos e águas, privando-o assim
do seu alimento preferido.
Situações mais graves, em que os
escorpiões se espalham por um bairro, ou prédio é necessária a presença de um
especialista para ditar diretrizes de controle, inclusive do aspecto
preventivo.
Algumas situações permitem o uso de
animais como galinhas como controle biológico.
O trabalho preventivo de remoção de
resíduos que sirvam como abrigo para estes animais é o mais importante e deve
ser praticado na presença ou ausência de escorpiões.
Lucia Schuller
Bióloga e Mestre em Saúde Pública